Intervenção de Sebastião Santana
Membro do Conselho Nacional

 

Valorizar a Administração Pública e os seus Trabalhadores

Camaradas,

O mandato que agora termina fica marcado por enormes desafios. Os dois primeiros anos foram de pandemia, situação com que o mundo não se confrontava há mais de um século e que, para além do desafio de saúde pública que constituiu, tornou evidente a natureza capitalista da sociedade em que vivemos, com os grandes grupos económicos, as multinacionais e outros sectores do capital a não desperdiçar a oportunidade de acumular mais riqueza, de intensificar a exploração e de condicionar ou retirar direitos, como tentaram fazer com os direitos Sindicais. Prontamente combatidas estas intenções no nosso País, por esta Central Sindical de Classe, nem o Capital foi até onde queria na limitação do direito à greve e ao exercício da atividade sindical, nem o governo chegou ao seu objetivo de perpetuar na Administração Pública as medidas tomadas para responder à situação excecional que se vivia. Evidentes neste período ficaram dois factos:

O primeiro é que sem serviços públicos, como muitas vezes dizemos, não há democracia!

Foram os trabalhadores da Administração pública a assumir a linha da frente da resposta à pandemia, às suas consequências sociais e de saúde pública. Por um lado, foram os trabalhadores da saúde a assegurar nos hospitais e centros de saúde do Serviço Nacional de Saúde, muitas vezes com carências de meios e com elevadíssimos ritmos de trabalho, a resposta imediata ao problema de saúde de muitos milhares de pessoas, enquanto o sector privado da saúde, que hoje alguns afirmam dever “complementar” o SNS, se escondia do COVID e revelava um facto indesmentível: quando não há lucro, não se pode contar com os privados da saúde, nem que esteja, como esteve, em causa, a vida de milhares de pessoas.

Mas a resposta dos Serviços Públicos não se ficou pela questão de saúde. As escolas acolheram quem não tinha mais opções, a segurança social processou muitos milhares de documentos a mais, as autarquias locais não deixaram de garantir serviços como água e saneamento, as forças de segurança não deixaram para outros as suas responsabilidades. Do governo, na altura, recebemos palmas, agradecimentos e promessas. Todas elas goradas, como o tempo veio a demonstrar.

O outro facto que ficou evidente, durante esse período e depois dele, com a guerra na Ucrânia, que mais uma vez serviu de arma de arremesso para justificar a retirada de rendimentos aos trabalhadores e uma subida muito acima do justificável dos preços e juros, foi a importância do nosso Movimento Sindical.

Não fosse esta Central de Classe, a CGTP, e é difícil antever até onde as mãos do Capital teriam chegado!

Durante todo o mandato que agora termina, o cenário foi de agravamento das condições de vida e de trabalho no País. Esvaziados, por opção do governo e em conluio com a UE, de instrumentos económicos que permitam a afirmação da soberania económica e conduzidos por políticas que optam por desvalorizar a Administração Pública, é evidente que os seus trabalhadores não ficaram alheios ao agravamento das condições de vida e de trabalho, sentidas por todos os trabalhadores. O governo do Partido Socialista, manteve, no essencial, sobretudo durante o período em que deteve o apoio de uma maioria absoluta no Parlamento, políticas de desinvestimento na Administração Pública, de degradação dos Serviços Públicos e de desresponsabilização pelas Funções Sociais do Estado.

Exemplos concretos do que acabo de afirmar, são a transferência de competências para as autarquias locais de sectores como a Acção Social, a Educação, a Cultura, o Património e a Saúde. De facto, não se trata de uma transferência de competências, trata-se, isso sim, da desresponsabilização do Estado Central por tarefas que lhe são atribuídas constitucionalmente, não para melhorar os Serviços, antes para abrir o caminho ao Sector Privado em áreas tão determinantes como as que acabei de referir.

Também na linha da desresponsabilização do Estado Central, está o tão propalado Sector Social. Será, provavelmente, um dos melhores exemplos no que diz respeito à desresponsabilização do Estado. Atiram-se milhares de milhões de euros para Instituições de Solidariedade Social e assobia-se para o lado quando se trata de garantir a qualidade dos Serviços, a sua universalidade e os direitos dos trabalhadores que os prestam. A degradação dos Serviços Públicos, como a Escola Pública e o Serviço Nacional de Saúde, estiveram na também na ordem do dia. Com o subfinanciamento alternando com o desinvestimento crónico, o resultado ficou à vista de todos.

Nada disto ocorre por acaso. Trata-se de opção política. Como denunciámos muitas vezes, não é possível defender o Serviço Nacional de Saúde, entregando metade do seu orçamento ao Sector Privado, desinvestindo na sua modernização e desgastando ao limite os seus profissionais. O objetivo deles é claro: transformar o Serviço em Sistema. Daqui afirmamos: não o permitiremos! Não contem com o silencio dos trabalhadores da saúde para destruir uma das mais importantes conquistas da democracia! Sabemos bem que o ataque aos Serviços Públicos não se faz sem atacar quem os garante: os trabalhadores da Administração Pública. Esse ataque, vem de longe e continuou pela mão do governo que agora cessa funções.

Os dados, Camaradas, são inequívocos:

- Perdemos mais de 20% de poder de compra desde 2009, apesar da propaganda sobre aumentos de salários;

- Destruíram-se centenas de carreiras profissionais na Administração Pública;

- Registaram-se níveis recorde de precariedade na Administração Pública;

- Manteve-se o essencial de um Sistema de Avaliação que apenas serve para garantir a estagnação salarial;

- A idade média dos trabalhadores da Administração Pública subiu em 2023 para os 48,3 anos;

- O investimento é percentual mente inferior ao valor da inflação, na globalidade da administração publica, estando em causa não apenas a capacidade de esta se modernizar, como a de sobreviver.

São estas as políticas que nos querem fazer crer que são “de esquerda”, são estas as políticas que os trabalhadores da Administração Publica vão continuar a combater. Combate que também já deu frutos, com a valorização, ainda que insuficiente de algumas carreiras profissionais, o desagravamento das condições de progressão associadas ao SIADAP e mesmo a reposição de carreiras, como foi a dos Técnicos Auxiliares de Saúde, ex- Auxilares de Acção Médica, luta da qual os trabalhadores saíram vitoriosos, após mais de uma década de combate. Momento de grande importância na luta dos trabalhadores da Administração Pública, foi a greve que levou ao um aumento intercalar de salários em 2023, que, antes da greve, era classificado como inadmissível, injustificado e impossível. Camaradas, como sempre, foi a luta dos trabalhadores a mostrar que impossível é o que os trabalhadores decidirem que não é possível e não o que nos querem impor!

É por isso que a luta no seio dos trabalhadores da Administração Pública se vai continuar a desenvolver! É porque acreditamos que Abril é mesmo para cumprir, que o Serviço Público tem mesmo que se reforçar e que isso, camaradas, só é possível com a valorização do trabalho e dos trabalhadores. Assumindo como prioridade das prioridades, em especial neste período que antecede as eleições legislativas, o esclarecimento os trabalhadores sobre as opções que se lhes colocam, é necessário responsabilizar os mais de 740 000 trabalhadores da Administração pública pela opção que tomam no próximo dia 10 de Março. É necessário dar-lhes confiança num futuro melhor e isso, camaradas, sem a luta, não é possível.

Levando a luta ao voto, resolvemos uma grande parte do problema, no entanto, depois de votar é necessário garantir que as nossas principais reivindicações são atendidas, seja qual for o governo que resultar das próximas eleições. Camaradas, contém connosco para continuar a luta por mais e melhores Serviços Públicos, contém com os trabalhadores da Administração Pública para engrossar a luta geral dos trabalhadores, por melhores salários, contra a precariedade, por mais direitos!

Viva a Luta dos Trabalhadores!

Viva a CGTP-IN!                                                                                                

Seixal, 23 de Fevereiro de 2024