A natalidade e a fecundidade estão a diminuir no nosso país há várias décadas.

apoio paiHá factores sociológicos que explicam essa redução ou o seu adiamento, nomeadamente, as alterações nas expectativas de vida – designadamente das mulheres relativamente ao seu papel na sociedade – a maior participação das mulheres no emprego, o prolongamento dos estudos, um maior controlo da fecundidade por via do planeamento familiar, a redução da maternidade precoce, correspondendo a ganhos civilizacionais. O direito a estudar e a realizar-se profissionalmente – o que toca em particular as mulheres – bem como a escolher quando, ou se, se quer ser mãe ou pai, são de valorizar.

Mas também há condicionantes económicas e laborais, como o ter ou não emprego, a estabilidade dos vínculos, os salários auferidos, a organização e o tempo de trabalho, o acesso à habitação, entre outros factores, que levam a que a fecundidade desejada não seja muitas vezes concretizada ou que seja adiada, o que tem reflexos na natalidade. Para a queda da natalidade concorre também a emigração, que ocorre sobretudo entre os mais jovens e que radica nas mesmas causas que levam à diminuição da fecundidade.

Desde os anos 70 do século passado, com excepção dos dois anos que se seguiram à Revolução de Abril e da segunda metade dos anos 90, quase não houve crescimento da natalidade e, quando houve, não se retomaram os níveis anteriormente observados.

No período mais recente assistiu-se a uma queda expressiva dos nascimentos entre 2011 e 2014, consequência da política de empobrecimento levada a cabo pelo Governo PSD/CDS, alguma recuperação em 2015, 2016 e 2018 e nova descida nestes três últimos anos, dois deles vividos em tempo de pandemia da Covid-19. Em 2020 a diminuição foi de 2,5% face ao ano anterior e em 2021 de 5,9%, ficando os nascimentos pela primeira vez abaixo dos 80 mil.

tabela nados vivos

Fecundidade abaixo do desejado

A fecundidade realizada (número de filhos efectivamente tidos) tem ficado sistematicamente abaixo da fecundidade desejada (número de filhos biológicos desejados ao longo da vida), mas se fosse concretizada asseguraria a substituição de gerações necessária para não haver decréscimo natural da população.

De acordo com o Inquérito à Fecundidade 2019, do INE, o número médio de filhos efectivamente tidos por mulheres e homens foi de 0,86, bastante inferior ao número médio de filhos desejados (2,15), número esse que é semelhante ao necessário para a substituição das gerações (2,1). O mesmo tinha sucedido no inquérito anterior, de 2013, se bem que os valores dos dois primeiros indicadores tenham sido um pouco superiores.

Também o número de filhos considerado ideal para uma família é superior ao valor de substituição das gerações.

Mais de metade das mulheres dos 40-49 anos (51,3%) e dos homens do mesmo grupo etário (54,7%) desejavam ter mais filhos do que os efectivamente tidos.

Nas razões para ter ou não filhos, bem como para não ter mais filhos, pesam razões de ordem pessoal (vontade, o projecto de vida e a relação no casal) mas também material (razões financeiras, estabilidade profissional e condições de habitação).

Entre as mulheres sem filhos mas que pretendiam ter, os três motivos apontados como muito importantes foram a vontade da própria (68,2%), a vontade do cônjuge ou companheiro (62,6%) e os motivos financeiros (56,5%).

Refira-se que as condições de habitação foram referidas em 51% das respostas e a conciliação entre a vida familiar e a vida profissional em 40,6%. A vontade pessoal conjuga-se assim com a existência de condições materiais.

tabela mulheres sem filhos

Quanto às mulheres sem filhos e que não pretendiam ter, as três razões apontadas como muito importantes foram a vontade (59,2%), não fazer parte do projecto de vida (43,5%) e não se sentirem preparadas para nova gravidez/parto (32,6%). Os motivos de ordem material foram também apontados como muito importantes em mais de 1/5 das respostas: motivos relacionados com o emprego (22,6%), meios financeiros (20,8%) e conciliação entre a vida familiar e a vida profissional (20,7%).

Verifica-se também o adiamento da maternidade o que, se for muito prolongado, pode inviabilizar a intenção de ter mais filhos. A idade média da mãe ao nascimento do primeiro filho era de 23,6 anos em 1980, tendo aumentado para 30,5 anos em 2019.

Parte significativa das mulheres e dos homens com filhos (45,1% e 58,5%, respectivamente) tiveram o primeiro filho mais tarde do que desejavam. O adiamento foi de pelo menos 5 anos para 36,0% de mulheres e 47,7%de homens. Os motivos relacionados com a estabilidade financeira e no emprego e as condições da habitação foram os mais apontados para o adiamento da maternidade pelas mulheres que tiveram o primeiro filho mais tarde do que desejavam.

A grande maioria dos inquiridos (cerca de 90% no caso das mulheres) considerou que devem existir incentivos à natalidade, sendo o alargamento da rede e o acesso a creches, jardins-de-infância e ATL a opção que teve mais respostas. Foram também consideradas nas mais importantes: a flexibilidade dos horários de trabalho para mães e pais com filhos pequenos, a atribuição de incentivos fiscais às entidades empregadoras com práticas de gestão que apoiem trabalhadores com filhos, a redução de impostos para as famílias com filhos e o aumento dos subsídios relacionados com educação, saúde, habitação e alimentação dos agregados com filhos.

Nota-se, contudo, que em 2019 não foram incluídas no Inquérito à Fecundidade perguntas sobre salários, estar empregado ou ter emprego estável, redução do tempo de trabalho e habitação, ao contrário do que sucedeu no inquérito de 2013 relativamente a algumas destas questões.

Nesse ano, ter emprego e rendimentos foram questões referidas como muito importantes.

Licenças parentais

No que diz respeito às licenças parentais, verifica-se uma progressiva utilização pelos pais trabalhadores face ao número de crianças nascidas e às licenças gozadas pelas mães. No entanto, ainda há margem de progressão como se pode ver no quadro e gráfico seguinte, nomeadamente na partilha da licença de 120/150 dias (onde menos de 45% dos pais partilharam a licença face ao total de licenças usadas pelas mães).

O número de homens que receberam subsídio por licença parental obrigatória de uso exclusivo do pai aumentou entre 2009 e 2020, tal como a sua percentagem face ao número de licenças de mulheres, passando de 62,6% para 73,7%. No entanto, verificou-se uma diminuição de 3,7 pontos percentuais (p.p.) entre 2019 e 2020, ano em que a percentagem foi de 73,7%.

A mesma conclusão se tira quando se compara o número de homens que receberam este subsídio com o total de crianças nascidas (72,1% em 2020 face a 53,6% em 2009, registando-se em 2020 uma ligeira diminuição).

Houve também uma subida do número e da percentagem de homens que receberam subsídio por licença parental facultativa de uso exclusivo do pai em relação ao número de licenças de mulheres, passando de 52,2% em 2009 para 68,7% em 2020, ainda que tenha diminuído 3,3 p.p. entre 2019 e 2020.

O maior crescimento do número de homens a usufruir de licenças de parentalidade verificou-se que na partilha da licença de 120/150 dias, tendo a percentagem em relação à licença das mulheres passado de 10,1% em 2009 para 44,8% em 2020, verificando-se percentagens semelhantes em relação ao número de licenças nascidas. Esta percentagem contrasta com os quase 98% atingidos pelas mulheres face ao número de crianças nascidas atingidos em 2020*1.

 

*1 Relatório sobre o Progresso da Igualdade entre Mulheres e Homens no Trabalho, no Emprego e na Formação Profissional – 2020, CITE

tabela licencas parentalidadetabela licenas