Os trabalhadores e trabalhadoras do OPART, E.P.E., continuam a considerar que a Missão Artística desta entidade não está a ser valorizada e respeitada. A temporada lírica do Teatro Nacional São Carlos e as anunciadas alterações na direcção artística da Companhia Nacional de Bailado são novos factos que suportam a nossa opinião.
Temporada lírica do TNSC
A missão do TNSC continua a ser posta de lado e navega-se declaradamente à vista, como comprovam declarações recentes do Director Artístico, Patrick Dickie ao "Público": "Não consigo seguir uma linha orientadora (...) a minha linha orientadora passa por fazer projectos individuais muito estimulantes para os públicos, esperando que isso resulte - às vezes, mesmo por acaso - num todo equilibrado." Acrescenta ainda que espera que "o público de Lisboa venha assistir a, pelo menos, 2 óperas da temporada".
Na realidade os "vários públicos diferentes" do TNSC têm a vida facilitada, pois só têm de escolher entre 4, pois dos 8 títulos apresentados 4 são executados fora de portas. Das 4 que sobram dentro do TNSC uma será em versão concerto pelo que podemos reduzir a escolha a 3. Não está em causa o projecto de levar o Coro do Teatro Nacional de São Carlos e a Orquestra Sinfónica Portuguesa para fora do TNSC, mas não pode a programação no TNSC ser prejudicada por esta decisão.
Os trabalhadores do TNSC perguntam-se se, com os constrangimentos orçamentais existentes, esta será a melhor programação para assegurar a manutenção das assinaturas e das receitas de bilheteira, visto que apenas duas das óperas se podem considerar de repertório.
O TNSC é um teatro de ópera com dois corpos artísticos residentes especializados e que continuam nesta temporada lírica a ser subaproveitados apesar de o público esperar fielmente a sua presença, tal como se observa durante o Festival ao Largo, ao verificar a afluência dos "vários públicos diferentes" em concertos com o Coro do Teatro Nacional de São Carlos e a Orquestra Sinfónica Portuguesa em programações "tradicionais".
O serviço público do TNSC não será garantido com experiências e acasos que não podem ter lugar num teatro com 225 anos de tradição lírica de excelência.
Direcção Artística da CNB
Não podem os trabalhadores da CNB deixar passar a anunciada substituição na Direcção Artística sem pronunciamento. Consideram que devido à especificidade da posição - que não se cinge à criação de uma programação e da sua gestão mas exige também prática de treino dos bailarinos e preparação de bailados -, é necessário que os Estatutos do OPART contemplem um concurso público para o cargo de Director/a Artístico da CNB. Este concurso deve ter requisitos e critérios bem definidos, claros e com a apresentação de uma linha programática, e é importante que os próprios trabalhadores tenham também uma palavra a dizer. Só assim é possível garantir que este cargo seja preenchido por alguém que se encaixe num perfil tão exigente.
O governo, seja através do subfinanciamento, seja através das suas nomeações, continua a colocar em causa a missão da CNB. Não se questiona a ideia de uma programação heterogéna, mas há princípios básicos que estatutariamente a balizam e que estão longe de serem cumpridos. Pode a situação agravar-se porque ficamos agora a saber que é intenção da EDP cortar parte do importante apoio dado à CNB, o que seria verdadeiramente calamitoso para a próxima temporada.
Para lá do público, são naturalmente prejudicados os bailarinos e bailarinas da CNB que, tendo carreiras muito curtas, acabam por fazer parte de uma companhia que não atenta aquela que foi a sua formação específica e pela qual foram contratados.
Valorizar a missão artística do OPART, valorizar a Cultura e os seus trabalhadores
Em declarações sobre a sua saída, Paulo Ribeiro, Director Artístico demissionário da Companhia Nacional de Bailado, afirma ao "Público" que "falta dinheiro e falta vontade política para levar a CNB para a frente". Se substituirmos "CNB" por "Cultura", este é um bom resumo da política dos últimos governos.
A aposta na Cultura e, neste caso, numa entidade de criação artística única no país, tem de ser um objectivo prioritário deste e de qualquer governo. Este objectivo precisa de investimento político, definindo o Serviço Público de Cultura como pilar de desenvolvimento do país, e precisa de investimento financeiro, para que esse serviço público tenha as ferramentas adequados para cumprir as várias missões artísticas e culturais e para cumprir e respeitar os direitos dos seus trabalhadores e trabalhadoras, que também no OPART continuam a não ser totalmente observados.
É urgente devolver ao país duas "casas" únicas, TNSC e CNB, a que a cultura portuguesa tem direito, que o público merece e que os corpos artísticos e técnico-artísticos, com toda a sua versatilidade, estão preparados para preencher.