Desde há muito que a CGTP-IN reclama a necessidade de melhorar significativamente a formação profissional prestada nas empresas e fora delas. Não obstante a profusão de ofertas públicas e financiadas de formação profissional, grande parte ancoradas no FSE, a verdade é que para a esmagadora maioria dos trabalhadores portugueses a esperança de obtenção de formação ao longo da vida reside, quase exclusivamente, na formação que recebem da entidade patronal e, mais concretamente, na que respeita ao direito à formação contínua previsto no código do trabalho.
Não obstante esta realidade, de acordo com os dados relativos ao Relatório Único – Anexo C, em 2023, apenas 18,6% das empresas desenvolveram acções de formação, encontrando-se o grande problema junto das empresas de menor dimensão (empresas de 1 a 9 trabalhadores com 12,4% apenas).
O número de trabalhadores abrangidos situa-se nos 41,1%, sendo a participação mais baixa precisamente onde deveria ser mais alta, ou seja, nos trabalhadores com menos escolaridade e qualificações. Sabendo-se que em Portugal o número de trabalhadores com baixas qualificações continua a ser muito elevado, tal significa que muito existe a fazer quanto à criação de condições para o reforço das competências e qualificações da população activa.
Significa isto que não se trata apenas de criar os mecanismos que permitam a classificação, certificação e formalização do processo de aprendizagem e aquisição de conhecimentos. Na nossa opinião, muito do esforço a fazer e grande parte das políticas publicas a desenvolver devem dirigir-se para as condições materiais que estão, ou não, na base da decisão do recurso à formação profissional, seja a formação prestada pela entidade patronal aos trabalhadores, seja a formação procurada pelos próprios trabalhadores, complementarmente ou na ausência da formação recebida no local de trabalho.
Neste sentido, a realidade tem vindo a dar razão à CGTP-IN. Embora Portugal conte, hoje, com uma profusão de meios e mecanismos que garantem, e bem, o acesso à qualificação, a verdade é que a disponibilização desses instrumentos não tem sido acompanhada de políticas que promovam o acesso à formação profissional, por parte dos trabalhadores.
Se apenas 18,6% das empresas, em 2023, prestaram formação aos seus trabalhadores, tal quer dizer que em muitos casos, os trabalhadores vêem caducar os seus créditos de horas sem que reúnam condições para os utilizar por conta própria. Bem verdade é que existem os centros qualifica e os cheques formação, contudo, são os trabalhadores mais qualificados que conhecem e sentem a motivação para aceder a essas soluções e não os menos qualificados de todos. Dentro das organizações, como já referimos, são também os mais qualificados que são alvo da maioria da formação intra-empresarial.
Sabemos também que os trabalhadores menos qualificados são também os que mais dificuldades têm na utilização de estatutos de trabalhador-estudante e na reivindicação dos seus direitos, nomeadamente os que respeitam às horas não prestadas de formação. Esta menor capacidade para exercer direitos não acontece por acaso, sucede porque estes trabalhadores tendem, também, a ser os mais afectados pela precariedade laboral, os horários desregulados, a insegurança no emprego, em geral. Por outro lado, trabalhando e actividades de salário baixo e baixas qualificações, com pouca intensidade tecnológica e menor valor acrescentado, o incentivo patronal para a formação individual é quase inexistente.
Como temos denunciado, um dos mais importantes factores de degradação dos direitos destes e dos outros trabalhadores consistiu na destruição da contratação colectiva, na redução drástica da sua qualidade média e na continuada degradação e desregulação das condições de trabalho.
A verdade é que continuam a não existir incentivos reais, em matéria de salários, progressão na carreira e qualidade no emprego, para que os trabalhadores apostem na sua própria formação. Ao invés, as poucas políticas que têm sido desenvolvidas nesta matéria, consistem em incentivos para as próprias empresas. O que não tem dado grande resultado.
O facto de o acordo de formação e qualificação, celebrado no âmbito da CPCS, não responder a estes problemas de base, levou a que a CGTP-IN não o subscrevesse, vindo o tempo não apenas confirmar a importância dos mesmos para o desenvolvimento das políticas de qualificação e formação, como veio demonstrar que as medidas positivas que se enunciaram, não estão a ser aplicadas.
Assim, a CGTP-IN considera necessário desenvolver as Contas Individuais de Aprendizagem, mas fazendo-o em conexão com outras medidas como:
1. Melhoria do quadro legislativo em matéria de formação profissional intra-empresas, criando condições para a elevação da exigência, qualidade e universalidade do direito à
formação profissional contínua;
2. Criação de condições para que os trabalhadores se sintam incentivados à utilização das horas de formação que não lhes sejam ministradas pelas empresas, usando-as por sua
conta e por conta das suas necessidades de desenvolvimento profissional;
3. Reforço das garantias de utilização do estatuto de trabalhador-estudante do regime de dispensa para formação profissional por iniciativa própria, nomeadamente no que se
refere à obrigatoriedade de conciliação de horários de trabalho com a frequência de formação e educação;
4. Combate à precariedade e desregulação dos horários, como forma de alargar o acesso por mais trabalhadores à oferta disponível e formação profissional contínua;
5. Reforço do direito de contratação colectiva e interconexão das políticas de formação profissional com as condições de progressão na carreira, apostando numa relação benéfica e positiva entre reforço de competências e melhoria dos salários e das condições de trabalho;
6. Reforço da fiscalização nos casos de incumprimento do direito à formação contínua.
Em suma, a CGTP-IN defende que se criem condições para que o direito à formação profissional seja universal e não apenas uma prerrogativa de trabalhadores e grandes empresas ou dos mais qualificados. A valorização da formação profissional passa, sobretudo, por uma valorização dos direitos e dos trabalhadores, os beneficiários últimos das políticas de formação e qualificação.
EMP/FORM.PROFISSIONAL/CGTP-IN
6 de Março de 2023