(Separata nº52, DAR, de 11 de Janeiro de 2014)

A presente Proposta de Lei visa introduzir alterações à Lei do Orçamento do Estado para 2014, fundamentalmente no que diz respeito à Contribuição Extraordinária de Solidariedade, prevista no artigo 76º desta Lei.

A Contribuição Extraordinária de Solidariedade criada pela Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), com carácter transitório, como uma contribuição de 10% sobre as pensões de valor superior a €5000, foi sendo mantida nos anos seguintes, com sucessivos acréscimos na sua base de incidência e taxas e consequente alargamento do universo de pensões abrangidas.

Assim, o artigo 78º da Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2014) determina que ficam sujeitas à Contribuição Extraordinária de Solidariedade, fixada entre 3,5% e 10%, todas as pensões pagas a um mesmo titular de valor mensal situado entre €1350 e €1800, considerando-se para este efeito não só as pensões pagas por entidades públicas, mas também todas as prestações pecuniárias vitalícias devidas a qualquer título a reformados, aposentados e pensionistas, independentemente da sua designação, da forma que revistam e  da natureza publica, privada, cooperativa ou outra e do grau de independência ou autonomia da entidade pagadora; em acumulação com a referida taxa de 10%, as pensões que excedam 12 IAS e não ultrapassem 18 IAS ficam sujeitas a uma taxa de 15%, e as pensões de montante superior a 18 IAS, a uma taxa de 40%.

Na sequência da decisão do Tribunal Constitucional que se pronunciou pela inconstitucionalidade de uma Proposta de Lei do Governo que previa a redução generalizada do valor de todas as pensões em pagamento pela Caixa Geral de Aposentações, ao abrigo do chamado mecanismo da convergência de pensões, entendeu o Governo, pela presente Proposta de Lei, proceder a um novo agravamento da Contribuição Extraordinária de Solidariedade.

Para tanto, alarga a incidência desta Contribuição a todas as pensões pagas a um mesmo titular de valor superior a €1000, de tal modo que as pensões situadas entre €1000 e €1350, que até aqui se encontravam excluídas do âmbito de aplicação desta Contribuição, passam a estar sujeitas a uma taxa de 3,5%; e, além disso, determina ainda um ligeiro alargamento da incidência das taxas adicionais, de modo que as pensões de valor situados entre os 11 IAS e os 17 IAS ficam sujeitas a uma taxa de 15% e as de valor superior a 17 IAS a uma taxa de 40%.

Significa isto que o Governo avança com uma medida de substituição que vai atingir precisamente os mesmos alvos, ou seja os aposentados, reformados e pensionistas, e exactamente pela mesma via – a redução abrupta e inesperada do valor de pensões já atribuídas e em pagamento.

Assim sendo, podemos concluir que, tal como a medida visada na referida declaração de inconstitucionalidade, também esta será susceptível de violar princípios constitucionais relevantes e designadamente o princípio da tutela da confiança imanente ao princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2º da Constituição da República.

Por outro lado, não podemos ignorar que, tal como está concebida, a Contribuição Extraordinária de Solidariedade é, mais do que uma medida de redução da despesa, uma medida conjuntural de obtenção de receitas, em particular na nova configuração dada nesta Proposta de Lei.

De facto, a CES reveste as características de um verdadeiro imposto, que incide de forma unilateral e coactiva, sobre o rendimento pessoal específico dos aposentados, reformados e pensionistas, rendimento este que se encontra igualmente sujeito nos termos gerais ao IRS. Isto significa que os rendimentos destes contribuintes são afectados mais penosamente em sede de tributação sobre o rendimento pessoal do que os rendimentos de outras categorias de contribuintes, o que viola os princípios estabelecidos no artigo 104º da Constituição, em matéria de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares.      

Mais uma vez, este Governo actua como se, para fazer face aos problemas do défice e do desequilíbrio das contas públicas, existissem apenas duas fontes de rendimento possíveis, nomeadamente os salários e as pensões e outras prestações sociais.  
 
Não podemos deixar de salientar que os reformados, aposentados e pensionistas se encontram numa situação de especial carência e vulnerabilidade material, na medida em que já cessaram a sua vida activa e portanto não têm perspectivas de progressão profissional susceptível de aumentar no futuro o seu rendimento, na maior parte das situações não podem acumular pensões com rendimentos do trabalho (por impossibilidade legal ou até por impossibilidade física, pois não estão excluídas desta tributação pessoas com eventuais doenças incapacitantes e/ou degenerativas relacionadas ou não com a idade) e  frequentemente vêem aumentar de forma crescente os seus encargos nomeadamente com a saúde, sem esquecer que muitos deles, devido à crise, ao desemprego e às reduções salariais, são hoje o suporte de filhos e netos e das respectivas famílias.

No entanto, o Governo insiste em onerar precisamente este grupo de cidadãos com medidas acumuladas de redução de rendimento, revelando quer a sua profunda insensibilidade social, quer uma clara opção de classe contra os mais fracos e vulneráveis.

E não se argumente que a Contribuição Extraordinária de Solidariedade incide sobre pensões de valor elevado, salvaguardando as pensões mais baixas. Se é verdade que esta Contribuição começou de facto por onerar pensões de valor realmente elevado (de valor superior a €5000),  este limiar tem vindo a descer de tal modo que, com a presente Proposta de Lei a fixar o mínimo em €1000, já não é possível falar honestamente em tributação de pensões de elevado valor.

Além disso, não podemos ignorar o facto de que estamos perante pensões atribuídas por regimes previdenciais de natureza contributiva, onde existe uma forte relação sinalagmática entre as contribuições pagas sobre os rendimentos do trabalho e as prestações a que os beneficiários adquirem direito, o que significa que estes reformados, aposentados e pensionistas, que toda a sua vida cumpriram com as respectivas obrigações contributivas, são detentores de legítimas expectativas na permanência do valor da pensão que lhes foi atribuída, uma vez reunidas as condições legais para o efeito, confiando em que o Estado manteria e honraria o contrato com eles celebrado.

 
Neste contexto, a CGTP-IN rejeita firmemente mais este ataque contra os reformados, aposentados e pensionistas, que é simultaneamente um ataque aos direitos sociais e aos sistemas de protecção social.


        
20 de Janeiro de 2014